A nova “tradição” dos cadeados do amor nas pontes

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Não faz tanto tempo assim, estava eu passando por uma ponte em Paris quando reparei em jovem casal agachado junto ao gradil que subitamente se levantou e jogou algo no rio antes de partir. Ao me aproximar do local onde estavam, percebi que os dois tinham acabado de prender um cadeado com formato de coração e que, possivelmente, o objeto lançado era a chave. Achei engraçadinho e romântico e fotografei.

Ponte di Castelvecchio

Na viagem seguinte, visitando outras cidades, notei que em muitas pontes também havia cadeados e a curiosidade me cutucou. Observadora que sou, fiquei frustrada por não ter reparado em nada semelhante anteriormente. Já em casa, fiz uma revisão de fotos antigas com pontes para ver se encontrava algum cadeado, e… nada. Seria alguma lenda medieval em processo de reabilitação?

Plaza Mayor

Descobri que apesar de algumas histórias antigas, o “cadeado do amor” é uma tradição recente inspirada por uma passagem do livro “Sou Louco por Você” de Federico Moccia, autor de outro fenômeno editorial, “Três metros acima do céu”. Os personagens “selam” seu amor para sempre, prendendo um cadeado na ponte Milvio em Roma e em seguida jogam a chave no rio.

Torre degli Asinelli

O livro virou filme e os cadeados se transformaram em uma verdadeira febre pelo mundo. O simbolismo romântico do gesto se tornou um status obrigatório para os namorados e atrás dessa moda, pipocam vendedores de cadeados nas proximidades das pontes mais concorridas além de inúmeras empresas que gravam iniciais ou nomes em cadeados.

Pont de l'Archevêché

Passarelle Debilly

Da última vez que estive em Paris, fiquei espantada com a quantidade absurda de cadeados presos com fitinhas desbotadas, pedaços de plástico e outros penduricalhos e confesso que a visão me desagradou bastante. As outrora bonitas Pont de l’Archevêché e Pont des Arts, estão com aparência de lixo não recolhido.

Pont de l'Archevêché

Sei que amanhã aqui no Brasil é comemorado o Dia dos Namorados, e criticar os cadeados pode parecer inadequado. Porém, amor de verdade não pode nunca ser trancafiado. Não dá para considerar romântica uma pessoa apaixonada e, portanto, mais sensível, querer, em nome de um modismo poluir uma cidade e, mais grave, produzir lixo no rio, com a chave atirada. E mais: Relegar ao anonimato o próprio nome e de seu amor em uma floresta de cadeados.

Pont de l'Archevêché

Os cadeados do amor vêm provocando polêmicas. As autoridades se encontram em um impasse: Se os remove, correm o risco de serem taxadas pela oposição de anti-românticos ou de cercear a liberdade, se os deixa, coloca em risco a segurança das pontes. Não são poucos os moradores que se mostram incomodados com a desfiguração das áreas públicas, tendo surgido este ano em Paris o movimento “Libérez Votre Amour – Sauvez nos Ponts” (http://nolovelocks.com/fr/) reivindicando a remoção dos cadeados. E você leitor, é contra ou a favor da petição?

Um adendo: Com o post pronto para ser publicado na véspera do Dia dos Namorados, leio a notícia da queda no último domingo, 08/06, de um pedaço do gradil da Pont des Arts em Paris provocada pelo peso dos cadeados. Felizmente não houve vítimas. Pelo sim, pelo não, visitando a cidade, caso decida passear de barco pelo Rio Sena, evite o deck superior.

4 thoughts on “A nova “tradição” dos cadeados do amor nas pontes”

  1. Post mais sensato que li sobre o assunto até hoje. O pessoal se apega na ideia romântica da coisa e esquece todo o resto. E além de tudo uma “tradição” que começou “ontem” não é tradição, é modismo. Adorei que você colocou tradição entre aspas no título porque isso definitivamente não é tradição! Eu fui diversas vezes para a Europa desde 1999 e só comecei a ver esse cadeados nas últimas vezes – antes simplesmente não existia isso! Além é claro, de que o pessoal defende essa ideia com mais fervor do que defende os próprios relacionamentos – tem algo estranho por aí…

  2. Valeu o apoio, Fernanda,

    Já deve até ter sido romântico em algum momento, mas o excesso transformou o gesto em “bateção de ponto”.

  3. Você já disse tudo sobre este assunto: “amor de verdade não pode nunca ser trancafiado” O que mais a acrescentar?

  4. Obrigada, Aline

    É bem contraditório vincular a escolha deliberada de querer ficar perto de alguém a um símbolo de aprisionamento.

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