Uma peculiaridade que chama a atenção de quem visita a Europa é o hábito que alguns donos de lojas têm de levar seus cães para o trabalho. Não é incomum se entrar em uma delas ou em um restaurante e dar de cara com um totó displicentemente escarrapachado tirando uma soneca no chão.
É impressionante a fineza desses animais. Eles não se perturbam com a entrada de um estranho em seu “domínio” nem incomodam ou ameaçam o potencial freguês de seu dono. Permanecem na sua pose casual/indiferente, eventualmente balançando a cabeça ou ajeitando discretamente as orelhas, apenas para derrubar nossa recém desenvolvida teoria de pensar que eles são estátuas. Que educação!
Caminhando pelas ruas a gente se dá conta da importância dos cães no cotidiano das pessoas. Eles têm livre aceso a lojas, restaurantes, shoppings, banheiros públicos, metrô e trens. Muitos andam sem coleiras e correm soltos pelos parques.
Tamanha educação não é predisposição genética nem sorte. Os cães têm liberdade, sim senhor. Mas o direito é adquirido por conta de adestramento. Quanto melhor treinado o cão, mais regalias, ele poderá desfrutar. As leis são severas, claras e aplicadas. Proprietários de cães têm que trazê-los vacinados e são multados caso seu totó cometa algum ato anti-social.
Paris já teve a fama de ter mais cocô de cachorro pelas calçadas do que turistas e monumentos somados. Uma engaçada lenda urbana contava que os habitantes da cidade já nasciam com um sensor na ponta dos dedos dos pés que os permitia desviar mesmo ser prestar atenção aos onipresentes obstáculos.
Depois de diversas campanhas públicas, e principalmente, depois da aprovação de uma lei em 2002, o panorama das calçadas mudou definitivamente. Passaram a multar os proprietários que não recolhessem as sujeiras de seus animais. Esse argumento pecuniário foi definitivo.
Para acabar com essa notória e desagradável imagem da cidade, a Câmara Municipal também disponibilizou uma frota de motos com aspiradores gigantes para recolher os dejetos dos animais. O processo funcionou. Hoje em dia se anda com tranqüilidade não só em Paris, mas na grande maioria das cidades da Europa.
Não falta sinalização indicando o que é e o que não é permitido. Encontrei em diversas cidades lixeiras exclusivas para restos de animais e uma significativa quantidade de totens com caixinhas penduradas contendo sacos plásticos específicos para os proprietários embalarem a sujeira recolhida de seus bichos.
Aqui na nossa terra essa prática civilizada não é especialmente uma novidade. A grande maioria dos proprietários, por pressão social ou por consciência, tem o hábito de espontaneamente recolher a sujeira de seus animais.
Confesso que morro de inveja e adoraria eventualmente fazer compras, jantar em um restaurante ou andar em transporte público com meu cachorro. Claro que antes seria preciso lançar mão de recursos simples como hipnose ou reencarnação para que ele adotasse uma postura respeitável de cachorro europeu.