Apesar de sempre ter tido vontade, por muito tempo adiei visitar Roma por causa das incontáveis advertências de amigos relatando histórias aterrorizantes sobre perigosos motoristas perseguindo inocentes pedestres e a quase inexistência de faixas para atravessar a rua na cidade. Na condição de covarde, tendo mais medo de gastar dinheiro do que ser atropelada, o irresistível apelo de uma passagem aérea barata foi um argumento forte demais para ser ignorado, e fui.
Uma vez lá, teria que enfrentar de qualquer maneira meus temores e me concentrar em aproveitar a fascinante capital da Itália. Estimulada mais pela vontade de me livrar da bagagem do que pela curiosidade, enfrentei com bastante tranquilidade meu primeiro desafio: atravessar a rua em frente à estação Termini de trens.
Porém a “sorte de principiante” não me acompanhou por muito tempo. Não é preciso muito tempo nas ruas Roma para perceber com absurda clareza quem é morador e quem não é. O turista fica parado na frente da faixa de pedestres, titubeando, esperando que os carros parem para atravessar. Os romanos, simplesmente colocam o pé na pista e a cruzam, independente de veículos passando ou não – Simples assim!
Embora assustador, o sistema não deixa de ser racional. Em uma cidade com uma enorme quantidade de veículos trafegando, ao invés de interromper o fluxo a toda hora, sem motivo, os carros só param ou reduzem a velocidade se alguém, a pé ou em outro veículo, estiver atravessando a rua. O que existe ali é uma espécie de acordo de cavalheiros: os pedestres evitam abalroar os automóveis para sobreviver e os motoristas desviam porque a última coisa que desejam é ter a sua preciosa “macchina” amassada ou se envolver com a polícia.
Para combater a insegurança, siga o célebre ditado: “Em Roma, como os romanos” (e quanto mais romanos melhor). É muito mais confortável atravessar a rua escudado por um grupo de “experts” locais. Infelizmente, nem sempre haverá um de plantão, portanto, para que a coisa funcione direitinho para o seu lado, procure observar algumas regras básicas:
– Tenha em mente que, com poucas exceções, as faixas de pedestres são uma mera sugestão de ponto de travessia, com boa visibilidade para quem atravessa e para quem está dirigindo um veículo;
– Por mais pânico que esteja sentindo, exiba sempre um semblante casual, espere uma diminuição do fluxo e siga sem titubear. A sua hesitação só servirá para confundir os motoristas;
– Não mude de ideia parando ou andando para trás – Existe uma quantidade enorme de motos se desviando do automóvel que está desviando de você;
– Apesar de ter sido orientada a não estabelecer contato visual com os motoristas, achei mais interessante fazer o contrário e olhar com firmeza para comunicar de forma clara a minha intenção de seguir em frente;
– Procure atravessar em linha reta e pelo caminho mais curto. Quem está ao volante dificilmente conseguirá prever uma rota sinuosa.
Estaria mentindo se dissesse que assimilei o conceito numa boa. Ensinamentos maternos de segurança no trânsito são muito enraizados. Por mais que se tente convencer que os romanos não entrem em seus automóveis com intenções homicidas, há sempre uma certa tensão durante os segundos da travessia, com a dúvida se eles nos viram e se vai dar tempo para frear. Dei vexame várias vezes, mas voltei para casa sã, salva e maravilhada. Quem sabe a proximidade com o Vaticano e a Santa Sé possa explicar o milagre que é atravessar as ruas de Roma e chegar vivo na calçada do outro lado?